Glauco caminhava pelo gramado com
o olhar baixo, vigiando cada passo que seus pés calçados com tênis encobertos
de poeira traçavam. Chutava uma velha latinha de refrigerante como se trocasse
passos em um jogo de futebol, se imaginando em meio a um jogo disputado na
final de campeonato. Sempre se perguntava por que não havia feito nenhum teste
para o time da cidade. Depois de um último arremate naquele pedaço de metal
amassado em direção ao gol imaginário ele para. Olhou em direção aos carros
passando durante o trânsito engarrafado no horário de pico. Parou. Acendeu um
cigarro enquanto pensava em qualquer coisa que lhe passava pela mente.
Ultimamente não havia muitas coisas em sua cabeça com as quais valesse a pena
se ocupar, por seu próprio ponto de vista. Ali ficou durante alguns minutos
esperando sua condução para poder ir embora para enfrentar tudo novamente no
dia seguinte.
De forma recorrente ele
perguntava a si mesmo se estava fazendo a coisa certa para alcançar a devida
felicidade, no que, aliás, não acreditava. Mais um no meio da história. Mais
uma história no meio de várias outras e de outros transeuntes, indo e vindo sem
trocarem sequer olhares, correndo, cansados, desistentes, esgotados.
Sacou seu telefone celular e
pensou em ligar, mas desistiu. Pra quê dar prosseguimento nisso? Pensou. Seria
realmente necessário lutar mais uma vez contra sua própria vontade? Passara
toda a semana bebendo saudade e já estava embriagado em demasia, com o pouco
pudor que lhe restava levantou o orgulho e construiu um muro ao seu redor. Lá
estava Glauco, desolado. Isolado do mundo envolto por sua capa contra a
mediocridade, para ele era melhor acreditar que tudo não passavam de obstáculos
para o seu aprendizado e evolução e não eram nada além de uma fase ou algumas
fases.
Pensar ser melhor, ser
privilegiado, ser escolhido por vezes poderia trazer algum alento para um corpo
andarilho sem muito rumo, em busca de um sentido além do continuar. Parar não é
sinal de fraqueza, exaustão talvez. Glauco se reprovava e se culpava de ser tão
ingrato com a vida, com a saúde que gozava e com as oportunidades que avistara
em sua vida, apesar de todas as dificuldades.
Acendeu outro cigarro. Sabia que
aquilo ali era a maior imbecilidade que um jovem poderia cometer, quando
criança ele achava que dispor assim da própria vida conscientemente era muito
reprovável. Quando adulto, já não achava mais nada. Quem sabe a verdade sobre o
que realmente é válido fazer e do que é realmente necessário privar-se.
Em dados momentos Glauco
acreditava ter encontrado a conexão entre as coisas que aprendera, lera e as
experiências que passou na vida. Pensou realmente ter chegado ao ponto de
controlar suas emoções e saber o ponto certo de parar e mudar de trajetória e
então ao passo que estava com os sentimentos em uma prateleira em que poderia
manipulá-los e ser o dono da própria vida, tudo veio a baixo. Quando ele pensava que sabia de tudo, já não
entendia mais nada.
O ônibus não passava. Glauco
continuava perdido em seus devaneios, observando o comportamento das pessoas
fadadas àquela rotina até o dia que não estivessem mais por aqui. Ele não
queria ser como todos, aposentados, reclamando da vida que levaram e do resto
que ainda os esperava. Ele queria ser filósofo. Acendeu o terceiro cigarro e
morreu um dia de cada vez.
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