28 de novembro de 2019

Me atraso

Me atraso todos os dias, preso aos meus próprios erros. Abraço meu equívocos enquanto me apego a dor que carrego no peito, pois ela mantém vivo o que não existe mais dentro de mim.

Meus vícios tomam conta do meu corpo como se fossem o próprio alimento, ao passo que bebo das coisas que me fazem mal todos os dias, como se não fossem verdadeiros venenos.

Me mantenho longe, cada vez mais longe do que se aproxima porque não quero mais estar exposto. Mas estou exposto por conta das minhas péssimas escolhas de todos os dias.

Mais uma vez, errei da mesma forma que, ontem, jurei que não faria. Mais uma vez, disse o que não jurei que não diria. Mais uma vez, estive onde jurei que não poria mais os pés e agora me vejo aqui, mais uma vez, de joelhos, cedido aos meus desejos mais vis.

Me atraso todos os dias planejando os novos hábitos e falho miseravelmente, pois estou habituado a ser eu mesmo. Nada demais. 

Me atraso todos os dias esperando ouvir o que gostaria que fosse dito, mas não saberei jamais.

Me atraso todos os dias tentando me manter de pé e as pernas doem ao subir as escadas, o corpo dói ao levantar, a alma dói no silêncio e o coração dói todas as noites, quando me pego no meio daquela multidão vazia. O que estou fazendo aqui, afinal?

Me pergunto, com quanto dinheiro se compra um pouco de paz?

Me atraso todos os dias tentando entender o que estou fazendo aqui, quanto me alimento dos meus equívocos, bebo das minhas frustrações e me mantenho firme, pois já não há mais nada que seja capaz de fazê-lo, por mim...

20 de novembro de 2019

E quantas vezes morrerei?

E se eu disser que é o fim e que daqui não passo? Daqui não passo, a partir daqui não quero mais. E se eu disser que já deu e que escolho que seja o fim?

E se eu disser cansei e terminar com tudo de uma vez, o tempo para? Se eu acabar de uma vez por todas com todo esse caos, encontrarei a paz? Ou não encontrarei nada? Ou começará tudo de novo, enfim?

E agora se eu me sentir esgotado e não quiser mais caminhar, a vida dá um tempo? Será que a vida me daria um tempo se eu acabasse de uma vez com isso, agora, aqui?

E quando a vontade de acabar logo ao acordar vai acabar, antes de dormir? Por mim. Se eu deixasse de existir, a vida me daria uma tempo?

E depois de tanto tempo pensando, acho que a vida não pararia. A vida nos atropela e já perdi as contas de quantas vezes eu morri. Sim, morri a cada falha, a cada frustração, a cada decepção, a cada saudade.

E agora tanto faz ficar ou ir, estar ou deixar de existir, morrer ou sorrir, porque a vida vai passar por cima de qualquer forma e a única opção é seguir, mesmo que não se siga. E se eu disser que daqui não passo, a vida passará por mim.

E fico pensando, quantas vezes ainda morrerei. Quantos de mim serão aniquilados pela completa falta de interesse. Quantos eu não serão mais eu daqui a pouco. Quem eu era já nem reconheço, assim quando olho fundo nos meus próprios olhos.

E fico me perguntando o que estou fazendo aqui? E fico pensando, quantas vezes morrerei, ainda que vivo, dentro de mim?

4 de novembro de 2019

Doía

Doía tanto que eu nem sentia o cheiro de terra molhada quando a chuva caia. Doía tanto que eu nem reparava no nascer do sol de todo dia.

Doía tanto que me esqueci de contemplar a beleza do meu próprio corpo, de aproveitar os sabores de conviver com o outro. Doía tanto que todo dia era só mais um dia.

Doía tanto e eu já não enxergava nada, me afogando as mágoas de ideias, de pessoas e de águas passadas. Enquanto doía e eu berrava por dentro, no silêncio do sofrimento, a primavera passou.

Doía tanto que não aproveitei as noites frias, para vestir tocas, casacos e curtir a fumaça que saía da boca. Doía tanto que não aproveitei as noites gostosas de sono, de chocolate quente, de epifanias e de silêncio ardente. Enquanto doía e eu me entregava aos sentimentos ruins, o inverno passou.

Doía tanto que não aproveitei as rápidas e intensas águas do céu para tomar banho de chuva. Doía tanto que eu me preocupava em mostrar ao mundo como estava triste e, mediante o tempo que não para, perdi o sol, a praia, as águas, o horizontes, o céu azul, as trombas d'água, a cachoeira e tudo o que acompanhava. Enquanto doía, o verão passou.

Enquanto doía o tempo passava. Enquanto eu parava a vida não parava. Enquanto doía eu me enganava, alimentando uma dor que não existia. Enquanto eu sofria, não aprendia nada. Enquanto eu me diminuía a energia baixava. Enquanto eu não via, o outono passou. O vento levou. O amor se calou. Outra chegou.

Enquanto doía eu perdia o presente e hoje o maior presente é saber onde estou, enquanto eu passo a vida passo por mim e sei exatamente aonde vou. Enquanto doía me perdi, mas encontrei tudo que eu sempre busquei. Ser completo pede que abramos mão daquilo que imaginávamos nos completar.

Enquanto doía, eu acreditava que doía por ter sido arrancado, mas eram apenas minhas mãos queimando de tanto segurar o que não quis ficar. Doía tanto que eu acreditei na dor e perdi verão, outono, inverno, primavera.

Enquanto eu acreditava na dor, perdi as chuvas, o sol se pondo e chegando, perdi as cachoeiras revigorando, perdi a beleza das praias e o barulho  do mar. E quanto mais eu perdia, mas me preparava para chegar, no auge de mim mesmo.

Enquanto eu era, eu fui. Agora eu sou e não sou mais. Enquanto doía eu acreditava na dor. Agora a vida me ensinou que eu acreditava em mim mesmo para doer, mas agora acredito em mim mesmo para conseguir ver, que o que passou, foi porque eu deixei passar. O que perdi foi a necessidade de tentar me completar, sem precisar.

Doía tanto que eu nem sentia o cheiro de terra molhada quando a chuva caia. Doía tanto que eu nem reparava no nascer do sol de todo dia. Mas hoje não dói mais, pois sou o meio próprio farol, Deus de mim mesmo, completo e firme.