Daqui levei estritamente nada, quando fui mandado para lá já tinha vivido algumas poucas coisas que por incrível que pareça é a sensação de qualquer pessoa que fará a viagem, seja ela eu ou você, seja um jovem octagenário ou um velho garoto ambicioso, seja lá quem sabe um bicentenário.
Daqui levei estritamente nada, fui de alma e alma já que nem o corpo tive o direito de trazer comigo, não que isso seja algo ruim necessariamente. Acomparam-me pensamentos, arrependimentos, saudades, tristezas e um punhado de felicidade dos quais não conseguiria me desfazer nem depois de vidas e vidas.
No começo até que pareceu bem estranho sair do comum e ir em direção à sociedade do mau, seguindo direto para as chamas quentes do castigo sob uma força mais do que incisiva, amedrontadora de tão presente. Àquela presença era tão intimidadora e visível que nem a falta de imagem me fez duvidar sequer um segundo de que ali conosco havia algo.
Engraçado que nos vicios da rotina não nos damos conta do tanto de forças que agem em torno de tudo o que é feito, o mundo é um emaranhado de fios e linhas tênues que causam efeitos devastadores sem que deixem rastros capazes de nos racionalizar o processo por inteiro.
Eis a duvida, eis a incerteza, eis a fonte de todos os aproveitadores tão mundanos quanto as palavras que pronunciam, tão vazios quanto o que dizem preencher. Essa viagem não foi agradável ou divertida, foi pesada e constante mas passou. Assim que estive de volta percebi que aqui é muito pior, bem pior aliás.
Ah, que mundo é esse? Onde valem os interesses, e só. Aqui vivem os bons, os maus e mais uma porção de produtos do medo, da violência, do amor, da vaidade e de tantas outras matérias primas. Ouviu-se dizer que o inferno é quente e sombrio, e aqui também não se faz assim por algumas tantas noites? Ouviu-se dizer que o mal impera e reina sobre a justiça igualitária utópica dos intelectuais, e aqui?
Senhores, onde foi que ouviste dizer que o inferno são os outros se não aqui mesmo onde o inferno são todas as coisas que prejudicam, de graça. Todas as coisas que dão errado por nada. Todas as situações geradas pela pura satisfação de constranger. Os planos maquiavélicos mais terríveis não são os que visam um objetivo onde os fins justificam os meios, porém nesses casos os fins não justificam nem a si mesmos e os meios são torpes, usou-se da pouca boa fé que ainda resta para fazer o mal, puro e essêncial. O mal vazio.
De volta do inferno não agradeceu-se por não estar mais lá, mas valorizou-se a viagem porque agora sabe-se que o mundo não é o paraíso nem tampouco o inferno, é muito melhor que o céu e pior que o inferno porque esses dois idealiza-se, o mundo é vivo e constantemente presente.
@adilsongl